Slow-Parenting: entenda o ‘Movimento dos Pais sem Pressa’

Qual a sua lista de atividades para hoje? Provavelmente, será imensa e o tempo disponível não dará conta das tantas tarefas a serem cumpridas. Se você morar em um grande centro urbano, então, esqueça. A probabilidade de realizar tudo aquilo a que se propôs será ainda menor, já que o ritmo da cidade e as expectativas geradas em torno do ‘fazer’ são incompatíveis com aquilo que está ao alcance de uma pessoa ‘comum’, dentro das suas 24h diárias. Texto original publicado no site de A Crítica.

Vivemos em um mundo que valoriza a velocidade, a produtividade e a quantidade. É preciso entregar o máximo possível, em tempo recorde. Trata-se da lógica capitalista, que rege a sociedade de consumo, na qual estamos todos inseridos.

Esse ritmo veloz interfere em nossa relação com o mundo e com nossos pares, afeta, inclusive, a possibilidade de conhecermos – e respeitarmos – nosso próprio tempo. Viver sob essa constante pressão também abre caminhos para que sentimentos como a ansiedade, a angústia e a desmotivação se manifestem.

Dentro dessa dinâmica acelerada, a competitividade assume papel relevante. São muitas empresas, muitos produtos, muitos funcionários, muitas tarefas: é preciso ser o melhor, sempre. E esse recado é reforçado pelo discurso publicitário, que cria expectativas irreais, ao apresentar um modelo de “perfeição” para tudo e todos que participam da sociedade. A “família perfeita”, o “pai perfeito”, a “mãe perfeita”, o “filho perfeito”, o “funcionário perfeito”, a “casa perfeita”, o “carro perfeito” e daí em diante.

É preciso ser perfeito. Os pais vivem essa pressão e, pensando em preparar o filho para o mundo, também desejam que eles alcancem a perfeição. Contudo, a ideia de perfeição construída pela indústria da propaganda, em dialogia com o mercado, pode ser extremamente cruel e não endereçar as reais necessidades do humano, tanto em sua fase adulta, como também na infância.

Pensando em dar o melhor aos filhos, os pais estão incentivando o superagendamento da infância. Crianças de 3 anos dividem-se entre a escola, aulas de natação, inglês e música. Mas, será realmente necessário estabelecer essa rotina intensa e corrida? Será que o ritmo da criança acompanha as exigências de horários e atividades desta agenda?

Para a psicóloga Adriana Fóz, coordenadora do Projeto Cuca Legal (UNIFESP), é preciso respeitar o tempo da criança. “Até os 5 anos os estímulos têm que ser mais naturais e, dos 6 aos 12, pode-se pensar em aprender de forma mais sistematizada, porém, sempre respeitando o ritmo e as escolhas da própria criança”, afirma a psicóloga.

Esse respeito ao tempo da criança exige um exercício profundo, que deve começar quando o bebê ainda está na barriga. Os pais mostram-se ansiosos desde a concepção do filho e criam muitas expectativas em torno da maternidade/paternidade e da vida futura desta criança que, diga-se de passagem, mal chegou ao mundo. Na cabeça deles, precisam ser “superpais” e criar ‘superfilhos’.

Esse comportamento conversa com o modelo de vida que nos é imposto (e que deve ser questionado). Alguns estudiosos, como o jornalista canadense Carl Honoré, passaram a pensar respostas a esse estilo de vida ultra-acelerado. Honoré foi um dos precursores do movimento “Slow-Parenting”, cujo objetivo é desacelerar a rotina dos pais, para que consigam conhecer a si e, principalmente, conhecer e respeitar o tempo da criança. Pais ansiosos certamente passarão tal sentimento aos filhos.

Honoré explica que a ideia do “Slow” não significa ir “a passos de tartaruga”, mas sim encontrar o tempo certo para realizar determinadas atividades. Devido à ansiedade em dar sempre as melhores oportunidades aos filhos, os pais tendem a antecipar descobertas que aconteceriam naturalmente em outro momento, provavelmente com mais sentido e com maior potencial para um real aprendizado.

O Movimento Slow também questiona a relação entre quantidade e qualidade. É preciso tempo para descobrir o mundo e crianças sabem disso; elas são naturalmente exploradoras, têm impulso por conhecer tudo o que as cerca e o farão, mas no tempo delas. Portanto, uma agenda lotada não necessariamente significa mais oportunidades para um desenvolvimento saudável, que garantirá melhores oportunidades no futuro. Muito pelo contrário. O superagendamento pode interferir no desenvolvimento da criança, impossibilitando espaços para o exercício da criatividade e gerando ansiedade e estresse, por exemplo.

Por isso, é essencial que os pais escutem suas crianças e entendam como elas apreendem os estímulos externos. O tempo da criança, que surge dela própria, é fundamental para o desenvolvimento e a construção de sua autonomia e identidade.

A verdade é que, em tempos de aceleração da vida, deixar crianças serem crianças parece algo extremamente estrangeiro, quando deveria ser tão simples e natural.

Para o Pedagogo Paulo Fochi, um dos porta-vozes do Movimento Slow-Parenting no Brasil, educar passou a ser compreendido como um empreendimento do futuro. “Os pais entendem agendas lotadas como sinônimo de qualidade de vida”.

Em busca de oferecer o melhor, questionam-se: “Quais serão os novos produtos, aulas e afazeres que o mercado criou para o meu filho?” – Com essa pergunta, que tem sua origem na lógica do consumo, acabam colocando a criança no ritmo do capital e interferindo naquilo que ela tem de mais genuíno: a espontaneidade!

Fochi defende que o tempo livre é essencial: “São nesses momentos que a criança irá experimentar, testar, abandonar, retomar um projeto. O tempo dá espaço para o inédito.”

Os pais precisam permitir aos filhos que construam suas próprias histórias. Crianças com rotinas que reproduzem agendas da vida adulta são submetidas a estilos de vida que podem interferir em sua autonomia, em sua autodescoberta e na descoberta do mundo.

O Slow-Parenting, portanto, configura-se como um movimento que incentiva o tempo livre e que busca equilibrar as expectativas familiares e as reais necessidades da criança. Defende a ideia da valorização dos pequenos prazeres em família.

Para desacelerar a rotina das crianças, porém, os pais precisam pensar em como estão organizando suas próprias vidas, o que estão priorizando e como estão se relacionando consigo mesmos.

*Carolina Prestes é formada em Comunicação Social pela ESPM-SP. Cursou especialização em Comunicação Mídia, Informação e Cultura pela ECA-USP e atualmente é pós-graduanda em Infância, Educação e Desenvolvimento Social pelo Instituto Singularidades. É editora do Blog ‘Além dos Muros da Escola’ e integra a equipe de Educação e Cultura da Infância do Instituto Alana.