Registro do roteiro de diálogo que construímos para o evento “(Des)Conexão: estar online é estar presente?“.
Hoje, nos comunicamos o tempo todo. Boa parte do tempo, porque estamos sempre conectados via tecnologias.
Mas no seu dia a dia, você pára pra pensar no que é comunicação?
O que é tecnologia?
Que lugar (que tempo? que espaço?) a tecnologia ocupa na sua vida?
Será que este lugar que as tecnologias ocupam foi conquistado por elas ou foi você que cedeu?
A tecnologia, ainda que não seja neutra, só faz sentido a partir de seus usos.
Você usa a tecnologia para se comunicar?
É possível se comunicar, se conectar, dialogar e desenvolver relações afetuosas com mediação tecnológica?
Você já se sentiu ausente em uma relação fisicamente presente e presente em uma relação mediada por tecnologias?
É possível construir experiências comunicacionais mediadas por tecnologias com vínculo e afeto?
Nós, do Desacelera SP, nos fazemos estas perguntas para pensar sobre a comunicação lenta: é possível usar as tecnologias e resistir à velocidade?
Ou as tecnologias são nossos grandes ladrões de tempo?
Comunicar é compartilhar, trocar, é viver, é amor. É negociar
É preciso destecnicizar a comunicação. E restabelecer a lentidão da comunicação humana
Interação não é comunicação, porque interação é rápido; e a comunicação é lenta.
A descoberta da natureza é a redescoberta da lentidão
Estas são provocações do sociólogo francês Dominique Wolton, que esteve recentemente no Brasil para conversar com estudantes de Comunicação.
Wolton é um dos mais importantes pensadores do campo da comunicação na contemporaneidade. Quando nos provoca, dizendo que “comunicação é amor”, Wolton coloca em xeque muitos dos valores que o próprio campo da comunicação eleva à condição de regras na vida contemporânea.
Wolton chama a atenção para a necessidade de promovermos um reencantamento do mundo; e para o fato de que não vamos conseguir fazer isso se formos tomados pelo que ele denomina de “comunicação técnica” – aquela mediada por computadores e celulares.
O sociólogo francês nos provoca a pensar que apenas presencialmente conseguimos nos comunicar humanamente, com nossos sentidos, com afeto, com capacidade de criar vínculo.
Ele destaca ainda que interatividade não é comunicação e que só conseguiremos nos comunicar quando pudermos restabelecer a lentidão. Nas redes sociais, o que existe, para ele, é expressão, mas expressão também não é comunicação. As redes promovem o que ele chama de ‘solidão interativa’.
Wolton diz que precisamos da experiência humana, que por sua vez, precisa de tempo para realizar as coisas.
Toda esta provocação que o Wolton faz, na verdade, a meu ver, é uma tentativa de radicalizar a tensão, para que possamos pensar nas relações entre tempo, comunicação e tecnologia.
Nós, no Desacelera SP, temos desenvolvido a ideia de que a percepção do tempo e o uso que fazemos do tempo devem ser processos conscientes. Quando você usa seu tempo de forma consciente, fazendo escolhas, você deixa de pensar que é refém de algo externo a você, e passa a tomar as rédeas desta relação.
Quem aqui tem a sensação de que está sempre correndo?
E qual o peso que as tecnologias e a comunicação têm nesta sensação?
Provavelmente, um peso grande.
Mas aí é que vem as melhores questões sobre a necessidade de pensarmos estas relações.
Muitas vezes as tecnologias são os nossos maiores ladrões de tempo. Mas que uso fazemos delas? Será que não é este uso que rouba seu tempo? Será que a sensação de que algo rouba nosso tempo não está mais relacionada com a nossa relação com este fim do que com como fazemos esta coisa?
Se algo não faz sentido para mim, eu acho que este algo está roubando meu tempo.
E a provocação é: quando você usa tecnologias, usa com que sentido?
Às vezes, correr faz sentido. Às vezes, a velocidade faz sentido.
Mas quando é que não faz sentido, e mesmo assim, a gente core, sem pensar por que estamos correndo?
Quando a gente pensa por que está correndo, a gente consegue parar e avaliar se correr é mesmo necessário. Se esta pressa depende só de nós mesmos, ou se é uma pressa do mundo.
Não queremos de modo algum que desacelerar vire uma regra, mais uma imposição, mais uma coisa que você deve fazer e colocar na agenda. Mas queremos poder conversar sobre o tempo.
Quem são os autores dos contratos de tempo na sociedade?
Como cada um de nós contribui para que estes contratos se perpetuem?
Que papel podemos ter na transformação das relações com o tempo.
O tempo é algo abstrato. É uma invenção.
Só faz sentido falar de tempo no aqui e no agora ou em relação a algum espaço ou lugar ou alguma relação.
Então, como usamos nosso tempo?
E em relação às tecnologias, é interessante pensar que elas não são neutras. Elas são o uso que fazemos delas. Assim como o tempo, elas são uma espécie de recurso, do qual devemos fazer um uso consciente.
E aí, entram os problemas que todos nós temos vivenciado sobre o uso exacerbado das tecnologias e como isso nos retira de um tempo-espaço de convivência presencial para construir um tempo-espaço de tele-presença e convivência virtual.
Deste pensamento, tiramos algumas provocações: quantas vezes somos mais presentes-conectados em relações telemediadas do que em relações presencialmente humanas?
É possível usar as tecnologias com todos os sentidos e simular conexão presencial de omo a criar afetos?
A experiência virtual não é diferente da experiência real; a experiência é uma só; e nossa experiência hoje é mediada pelas tecnologias.
Nós acreditamos que precisamos de menos telas e mais presença. Mas também acreditamos na potência das tecnologias para promover conexões.
Não podemos alimentar um debate infrutífero, porque as tecnologias são inevitáveis, mas podemos fazer usos conscientes delas; e humanizar estes usos.
* Com informações do site da Cásper Líbero.