A Revolução Slow será lenta, mas já começou!

A revolução slow trata de reivindicar a autonomia temporal e reequilibrar a relação com o tempo. E para isso, não existe uma receita universal. Desacelerar é justamente a permissão para pisar no freio e forjar uma receita pessoal para repriorizar o mais importante. Estas foram algumas das ideias que o jornalista e precursor do Movimento Slow, Carl Honoré, compartilhou com a platéia do teatro da Aliança Francesa, em evento promovido pela The School of Life Brasil no último dia 5 de abril.

Em um bate-papo descontraído e bem humorado com o psiquiatra Daniel Barros, Honoré contou sobre o seu próprio “ponto de inflexão” (ou “turning point”) para a desaceleração: quando se deu conta de que lia para seu filho dormir e resumia as histórias, ele percebeu que algo estava errado; e aquele momento que deveria ser prazeroso estava sendo um castigo. Segundo Honoré, nesta hora, ele teve um “estalo” e foi aí que começou o processo de reconhecimento e libertação da sua “tartaruga interna”.

Ele explica que o movimento de desaceleração é de dentro para fora. É um estado de espírito. Uma calma interna. E conta que se muitas pessoas brigarem para encontrar este seu estado, é possível promover transformações maiores, no mundo e na realidade veloz.

Honoré falou sobre a história do Movimento Slow e seus grandes objetivos. “Nossa maior meta é reumanizar a sociedade a partir do que é mais importante para o ser humano: as relações humanas vividas com plenitude”. Para ele é preciso colocar a qualidade da experiência antes da quantidade. E por isso é simbólico todo esse movimento haver sido iniciado pela comida, com o movimento Slow Food: “comer é prazer, tem valor social, tem que ter tempo e qualidade”, completa.

Devagar é bom

Honoré desconstrói um mito muito comum quando se fala de desaceleração e da vida devagar. “Desacelerar não é necessariamente ser lento, nem viver no ócio; trata-se de recobrar o controle do relógio e conquistar uma calma interna, que vai permitir saber quando é a hora de ser rápido e quando é possível ir devagar”. Ele explica que mesmo uma tarefa obrigatória feita com lentidão pode ter melhores resultados, ao contrário do que o discurso produtivista prega.

O jornalista e autor do best seller “Devagar” brinca com alguns exemplos de aceleração da vida contemporânea, que são verdadeiros absurdos, como o curso de “fast yoga” ou o funeral drive-thru, experiências com as quais ele toma contato em suas viagens de pesquisa ou em trocas com seus seguidores. “São exemplos que mostram como a velocidade se converteu em um valor positivo e uma espécie de vício, um produto que as pessoas buscam, um diferencial?”, questiona o psiquiatra Daniel Barros.

“Queremos tudo rapidamente. As pessoas querem até desacelerar rapidamente. Mas a revolução slow será lenta e já percebemos muitos sinais de mudança”, afirma Honoré. Ele cita os movimentos de desaceleração da comida, da medicina, da moda, das cidades, e até do sexo. “Hoje casais deixam de viver seus momentos íntimos para dividir a atenção com o celular. Mas muitos jovens já buscam apoio para se reconectar com as relações verdadeiramente, com presença e plenitude”, diz.

Tecnologia, velocidade e afeto

Honoré explica que a tecnologia é um dos grandes ladrões de tempo e atenção, e que é preciso saber fazer um bom uso dos aparelhos, para que eles não sejam aceleradores permanentes e não sejam o centro das atenções em momentos de convivência. “Desacelerar é estar presente no momento, plenamente. Por isso, a família tem a vacina contra o vírus da pressa. E mais ainda nas culturas latinas”, enfatiza.

As relações humanas, para ele, são a chave para desacelerar. “Elas não podem ser aceleradas, porque têm um tempo próprio, universal. Não se pode querer que alguém se apaixone por você rápido, porque você quer casar em junho; ou que uma amizade de uma vida seja construída em semanas. As relações exigem tempo, momentos lentos, humanos e bonitos”.

 

Fotos: Solano Diniz